Direito à moradia deve ser tratado como questão de saúde pública

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A Prefeitura de São Paulo, por meio do Cadastro Único para Programas Sociais, estimou que há na cidade mais de 53 mil pessoas em situação de rua. Longe de ser um problema social com solução simples, a falta de moradia para uma parcela expressiva da população já é um quadro histórico na cidade e a solução para ele deve ser multifacetada.

Os pesquisadores Juliana Reimberg, do Departamento de Ciência Política da USP, e Aluízio Marino, do Laboratório Espaço Público e Direito à Cidade da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, discorrem melhor sobre o assunto.

Morador ou em situação de?

Juliana Reimberg explica que o termo “morador de rua” é inadequado e pode, muitas vezes, ter uma conotação pejorativa e estigmatizante contra uma população que já está em situação de extrema vulnerabilidade social: “Eu sempre insisto na tecla da importância de a gente usar o termo população em situação de rua, ao invés de falar em moradores de rua. Sobretudo porque a ideia de permanência é muito forte quando a gente fala em moradia”.

Já o termo “situação de rua” faz mas jus à situação dessas pessoas, bem como evita conotações problemáticas: “Usa-se ‘em situação de rua’ para dar essa ideia de que é um momento, é uma situação, mas que é possível sair desse contexto e fortalecer de fato de que a rua não é um espaço de moradia,” completa Juliana.

Aspectos judiciais e culturais

Em sua pesquisa de mestrado, Juliana percebeu, com base nas decisões dos juízes, que a falta de moradia já é vista como um problema de saúde pública. “O que eu percebi na minha pesquisa é que os juízes, quando eram políticas de moradia, muitas vezes não acatavam o pedido da pessoa, mas quando era um pedido de saúde, eles garantiam. A lógica é de que a saúde é uma prioridade e faz parte de uma política nacional,” argumenta.

Aluízio Marino explica que o combate à falta de moradia é também uma questão cultural, que esbarra no racismo e na aporofobia, o repúdio e aversão à pessoas pobres: “Desde que o Brasil é Brasil, quanto ao modelo mais urbano das cidades ali do final do século 19, que a gente já convive com uma população em situação de rua, que não foi incluída no mercado de trabalho. Principalmente após o processo da Abolição, em que não teve distribuição de terra, não teve acesso a moradia, e não à toa essa população é majoritariamente negra,” expõe Marino.

Plano Diretor

Embora o Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo, elaborado em 2014 e revisto em 2023, estabeleça diretrizes para a construção de moradias e expansão da mancha urbana, a lógica sobre a qual ele trabalha é principalmente imobiliária, de empreendimento e comercialização, e não de justiça social. “Alguns dispositivos do Plano Diretor e do Zonamento são conquistas históricas, como, por exemplo, as zonas especiais de interesse social, que regula no território a produção de habitação de interesse social, de permanência de populações menos favorecidas economicamente nos territórios. Existem aspectos positivos, mas em geral o Plano Diretor é um plano imobiliário, e as revisões que aconteceram aprofundam essa lógica,” finaliza Aluízio Marino.

 

Fonte – USP

Foto – Divulgação

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