Nos últimos anos, os podcasts de entrevista ascenderam de forma estratosférica no Brasil. O formato, semelhante ao do rádio, proporciona longas conversas e diálogos descontraídos com diversas personalidades influentes do País. Aos poucos, os podcasts construíram um papel de forte influência e movimentação no debate público. Com isso, os políticos vislumbraram o formato como uma ótima ferramenta de autopromoção, já que podem ultrapassar fronteiras e acessar públicos com os quais não estão habituados. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os presidenciáveis João Doria, Sérgio Moro e Ciro Gomes são alguns exemplos desse fenômeno. Mas será que essa abertura despertou um maior interesse por política em parte da sociedade? Em entrevista ao Jornal da USP no Ar 1ª Edição, Adrian Gurza Lavalle, professor do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo, analisa o cenário.
O preço para se produzir podcasts é comparativamente mais barato do que outras mídias convencionais, como a televisão ou o rádio. Um meio para a gravação da voz e o conhecimento de alguns detalhes técnicos já permitem que alguém coloque o seu trabalho na mídia. De acordo com o professor, a redução do custo da produção dos podcasts “permite que esse conteúdo seja produzido por um número muito maior de produtores, uma quantidade enorme de outros produtores com outras ideias, outras gerações, outras formações, outras bagagens sociais e culturais fazendo podcasts. Isso diferencia a forma como o conteúdo é produzido e é tratado”. Se o conteúdo é produzido de forma diferente, é possível que ele desenvolva um nicho específico. “Então, você vai ter como ouvintes desse podcast grupos sociais com um perfil muito específico, aos quais você pode obviamente dirigir mensagens muito precisas, muito bem direcionadas. Isso vale para qualquer conteúdo, inclusive para informação política”, afirma Lavalle. A forma como um conteúdo é preparado e transmitido para o público pode facilitar o consumo por determinado assunto. Se a informação política é transmitida de forma acessível, com uma linguagem inclusiva e sob diversas óticas, é possível que algumas fronteiras sejam rompidas. “Você entrega informação política de forma mais natural ao padrão mais geral de consumo, de compreensão no mundo de absorção de informação que públicos específicos têm. Isso facilita a absorção ou interesse por essa informação”, atesta o professor.
Para Lavalle, esse fenômeno não é exclusivo da política, mas sim da dinâmica proporcionada pelos podcasts: “Você faz com que a informação política fale nos termos que a pessoa está disposta a entender, o que a pessoa entende. Isso tira da informação política aquela formatação mais tradicional, que é a que ainda tem na TV aberta ou na TV a cabo. Então, seria meu palpite, há sim essa facilitação e essa aproximação. Mas eu diria que isso é em relação a diversas formas de entretenimento e diversos tipos de informação, também a política”.
Há uma diferença importante na forma como são consumidos os podcasts, o público é quem tem a predisposição ou vontade de consumir determinado conteúdo. “Você não consegue acessá-lo a não ser que ele esteja interessado em escutar esse conteúdo, que é diferente, por exemplo, quando você está no carro, que você vai escutando propaganda e tudo que vem junto”, indica o professor, que ainda completa: “No podcast não, no podcast você vai lá e escolhe exatamente o programa que você quer assistir, você favorita, você tem o feed dizendo que chegou novo, você pode ir para trás, para frente e assistir aos anteriores. Você tem um repertório de outros casos que você gosta”. De acordo com Lavalle, o formato pode funcionar como mais uma ferramenta para aproximar os políticos da população: “Os podcasts e as formas de comunicação oral-auditiva são as formas de comunicação que mais têm crescido no mundo nos últimos dez anos e esse é o fenômeno dos podcasts. O consumo de informação via podcasts cresceu exponencialmente no mundo todo e isso tem feito com que os políticos vão procurar a população, vão procurar seu eleitor nesses podcasts”. Os políticos não vão mais buscar o seu eleitor no horário eleitoral gratuito. Para alcançar a população de forma precisa e despertar interesse em parte do público, eles procuram a população onde a população costuma se informar. Com isso, os podcasts servem como uma forma de contato. “Há, sim, um deslocamento dos políticos para procurar programas de podcasts e o uso que se faz mais inteligente é quando o político procura os postos com altíssima visibilidade, que atingem públicos específicos, aí você está sendo cirúrgico. Há sim, da parte dos políticos, uma tentativa de aproximação. O quanto ela é bem-sucedida é uma coisa que precisa ser aferida, depende de quão bem ele se desempenha, de quanta naturalidade, depende de várias questões e de quanto ele conhece o público para o qual ele está falando”, retrata o professor.
Fonte – USP
Foto – Divulgação