A cidadania diz respeito a um conjunto de direitos e deveres que cada indivíduo tem enquanto membro de um estado nação. Do latim civitas (cidade), a expressão foi sendo ampliada ao longo da história. Na atualidade, o conceito de cidadania vai além de ser o exercício do indivíduo no espaço urbano – em uma nação – com direitos e deveres a serem exercidos. Em se tratando do contexto brasileiro, a maioria das pessoas não conhece seus direitos como cidadão e tampouco se reconhece nesse conceito. A noção de cidadania acaba ficando mais vinculada à perspectiva do voto, como direito, e dá-se uma grande ênfase nos deveres e obrigações do cidadão.
A Constituição Federal de 1988 assegura que todo brasileiro é igual perante a lei. Contudo, para buscar essa igualdade, é preciso estar consciente de direitos. Com a proposta de incentivar o conhecimento sobre a cidadania, na perspectiva de direitos e deveres, a UFRN está promovendo uma campanha voltada para a sociedade, quando irá reforçar, por meio de divulgação nos meios de comunicação da Instituição (portal, TV, Rádio Universitária e mídias sociais (Instagram, Twitter e Facebook), material com ações e reflexões ligado à temática.
Cidadania é um conceito permeável e ligado à realidade de cada país/nação. No Brasil, a concepção de ser cidadão é bem diferente da vivenciada em outros países. Aqui, a história remonta a uma cidadania bastante embrionária na Primeira República. Vivíamos um período de escravidão, poderio rural nas mãos de poucos e ainda acesso limitado a direitos, entre eles o de votar.
Entre os anos de 1930 a 1940, a sociedade brasileira teve alguns avanços em relação a direitos, principalmente com relação às questões trabalhistas, com a regulação das relações de trabalho incorporada na Constituição de 1934, quando foi criada a Justiça do Trabalho. Em 1943, foi a vez da instituição da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), normatizando a legislação trabalhista do país. Nesse mesmo período, entre 1930 e 1940, foi instituído o voto feminino.
Nos anos posteriores até antes de 1964, as conquistas relacionam-se aos direitos políticos. Com o regime militar, o país sofreu um retrocesso em direitos civis e somente conseguiu retomá-los a partir de 1985, com a instituição da Nova República, que se fortaleceu com a Constituição Federal de 1988, conhecida também como Constituição Cidadã.
Para a assistente social e pós-doutoranda em Serviço Social do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social (UFRN), Iris Sousa, a expressão de cidadania envolve, atualmente, os espaços urbanos e espaços rurais, compreende direitos e deveres (civis, políticos e sociais) de indivíduos de diferentes gêneros, que vivem coletivamente em sociedade, de forma participativa, com nacionalidade reconhecida e com liberdade para decidir sobre as suas vidas.
“É pertinente clarificar que, ao longo das transformações ocorridas na sociedade capitalista, essa expressão, o seu conceito, nem sempre se coaduna à prática. Temos uma história de avanços e retrocessos na construção e exercício da cidadania, cujos direitos se efetivam, muitas das vezes, por força das reivindicações sociais”, pontua Íris.
A origem da palavra Universidade origina-se do termo latim Universitas, que se relaciona à universalidade, conjunto, comunidade. Um espaço onde conhecimentos são compartilhados com vistas à formação do ser/cidadão. O Estatuto da UFRN coloca como um dos objetivos da instituição o de desenvolver e difundir o conhecimento, tendo em vista preparar o indivíduo para o exercício da reflexão crítica e participação na produção, sistematização e desenvolvimento do saber.
Nesse contexto, a Universidade, como disseminadora do conhecimento e formação por meio da educação, torna-se, de acordo com a professora Iris Sousa, “um meio essencial de elevação da cultura e desenvolvimento de variados conhecimentos (empírico, filosófico, científico etc.), competências intelectuais, operacionais e sociais -, propicia a formação, construção e exercício da cidadania”. E, dessa forma, acrescenta ela, permite que os sujeitos se percebam como parte da história da sociedade, partícipes da história de um coletivo e construtores da sua própria história de vida.
Em sua opinião, a universidade precisa assumir o papel de protagonista da sua história e da sua função social e política, ou seja, investir em uma educação voltada aos interesses e valores humanos. “As universidades têm o papel, ainda, de pensar e propor um ensino para que os jovens se aproximem das necessidades, demandas e questões que permeiam a realidade local, através de programas e projetos”, coloca. Outro papel, discorre Íris, é o de qualificar os futuros profissionais para atuar nas diversas áreas do conhecimento, tendo atenção no eixo dos direitos sociais e da ética, e assim criar espaços que objetivem um pensar e agir coletivo e a democratização dos conhecimentos socialmente produzidos.
“Ao se perceberem como sujeitos de direitos e deveres, as pessoas se apropriam de algo que é valioso na vida do ser humano: a liberdade de fazer escolhas e tomar as suas próprias decisões”, pontua. Assim, complementa Íris, a relação entre cidadania e educação acontece quando os espaços sociais, dentre eles, os espaços formais de ensino (escolas, institutos, universidades) permitem que os indivíduos possam despertar o senso crítico, questionar a sua realidade, apreender os seus direitos, articular-se com outros sujeitos e criar caminhos – se necessário – para a reconfiguração da sua prática social e política.
A professora do curso de Antropologia da UFRN, ligado ao Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA), Juliana Melo, explica que a relação entre cidadania e educação é direta. “Só com uma educação de qualidade, e que incentive a dignidade humana, o pensamento crítico e o empoderamento de grupos sucessivamente excluídos de seus direitos (como os negros no Brasil, por exemplo), pode ampliar o acesso à direitos e a cidadania”, reforça. Ela ressalta ainda que é importante uma educação crítica na medida em que é preciso ter uma visão ampla da realidade social e que uma educação de qualidade, portanto, é base essencial para ser cidadão no sentido pleno do termo.
Elaborar políticas multidirecionais voltadas à educação para a cidadania é o caminho apontado pela professora de Direito da UFRN, vinculada ao Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA), Mariana de Siqueira. Para ela, essa educação para a cidadania não deve se limitar ao ambiente escolar. “Educação e cidadania, portanto, se ligam nessa relação de dependência mútua. Para conhecer a sua condição de cidadão, seus direitos e deveres, é necessário ser educado para tal”, complementa.
Se a educação é o pilar essencial para sermos de fato cidadãos, isto é, cumpridores de deveres, mas também donos de direitos como acesso à saúde, a um sistema de justiça menos desigual e reconhecidos em nossa dignidade, o caminho é abordar esse tema em nossas escolas de forma ampla e qualificada, defende a professora Juliana Melo. A docente acrescenta que todo estudante deveria saber quais são seus direitos e demandar do Estado ações nesse sentido. E que isso deveria ser incentivado desde o ensino fundamental.
O pensamento é também seguido pela professora Iris de Sousa. Ela pondera que, antes de tudo, o estudante deve compreender qual o papel da universidade, qual a sua função social, quais atividades e serviços são desenvolvidos e disponibilizados na instituição. “Com essa compreensão, o estudante terá a possibilidade de saber como participar ativamente desse espaço de formação, socialização e sociabilidade”, defende.
Dessa forma, acredita ela, ao inserir-se, por exemplo, em ambientes que estimulem a pesquisa, a participação em projetos de extensão, os estudos e debates coletivos, o estudante pode apreender os seus direitos e deveres, desenvolver o respeito à diversidade, assumir posturas mais empáticas e altruístas e, assim, contribuir para que os seus pares exerçam, também, a sua cidadania e colaborem de maneira mais qualificada e consciente na sociedade.
“Se a universidade, como instituição de educação superior, pode despertar e sustentar os princípios da democracia e cidadania para a vida humana, o estudante pode assumir o papel de protagonista na efetividade de valores como igualdade, liberdade, compromisso social, tolerância e tantos outros que podem resgatar a dignidade humana”, assevera Íris.
Já para Mariana de Siqueira, professora na área de Direito, os estudantes podem ser agentes multiplicadores dos ensinamentos sobre cidadania junto à sociedade. Ela coloca que os estudantes precisam viver a vida acadêmica conhecendo e exercitando os seus direitos e deveres. “A Universidade tem enorme papel nesse processo. As atividades de extensão são um ótimo exemplo da função social da Universidade no que tange especificamente a esse assunto da cidadania”, conclui.
Fonte – Ascom
Foto – Divulgação